Brasil ganha Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas
- Redação
- 23 de mai.
- 3 min de leitura
A iniciativa inédita é coordenada pelo Museu da Língua Portuguesa e Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, com financiamento da FAPESP

Você sabia que, além do português, mais de 175 línguas indígenas ainda são faladas no Brasil? Muitas delas, no entanto, correm o risco de desaparecer — levadas pelo tempo, pelo descaso e pela perda de espaço de suas culturas de origem. Pensando nisso, duas instituições paulistas resolveram agir.
O Museu da Língua Portuguesa (MLP) e o Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (MAE-USP) se uniram para criar o Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas, um projeto ambicioso e necessário que pretende ouvir, registrar, respeitar e celebrar a diversidade linguística e cultural dos povos originários do país.
O lançamento oficial aconteceu no último dia 20 de maio, no auditório do MLP, com a presença de ninguém menos que a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara — uma das vozes mais potentes nessa luta. O projeto é financiado pela FAPESP, com um investimento de R$ 14,5 milhões, e terá duração inicial de cinco anos.
Um Brasil que fala muitas línguas
Apesar da riqueza, cerca de 20% das línguas indígenas brasileiras nunca foram estudadas. Muitas delas são transmitidas apenas oralmente, dentro das comunidades, de geração em geração — e correm risco de desaparecer se não forem documentadas. Por isso, o novo Centro surge como um espaço de escuta e de cuidado, reunindo pesquisadores, especialistas indígenas, linguistas, antropólogos e também tecnologia de ponta.
Mais do que apenas preservar, o objetivo é dar visibilidade a esses saberes, modos de viver e expressar o mundo — registrando em texto, áudio e vídeo as vozes, os sons, as histórias, as receitas, os rituais e as memórias que fazem parte da identidade indígena brasileira.
Como vai funcionar?
O trabalho do Centro será dividido em três frentes principais:
Pesquisa e documentação junto às comunidades, sob demanda e interesse delas;
Criação de um repositório digital gratuito, que reunirá coleções linguísticas e culturais;
Ações de mediação e difusão cultural, com seminários, oficinas, exposições e programas educativos.
Duas mulheres lideram esse processo como pesquisadoras principais: a antropóloga Maria Luisa Lucas e a linguista Luciana Storto. Além disso, haverá seleção de 14 bolsistas de graduação e pós, e 5 técnicos — com incentivo especial à participação de candidatos indígenas.
Um passo além da academia
Para o MAE-USP, a parceria representa uma chance de ampliar o acesso aos mais de 150 mil objetos indígenas que compõem seu acervo, mas também de ouvir novas narrativas: “Vamos formar coleções digitais em conjunto com os próprios pesquisadores indígenas. É uma nova forma de pensar o que é memória e patrimônio”, explica o diretor Eduardo Góes Neves.
No Museu da Língua Portuguesa, a iniciativa é vista como continuidade de uma trajetória iniciada em 2022, com a exposição Nhe’ẽ Porã – Memória e Transformação, com curadoria de Daiara Tukano. “As línguas não são apenas instrumentos de comunicação. Elas são mundos inteiros”, resume Renata Motta, diretora executiva do museu.
Em sintonia com o mundo
O projeto também faz parte da Década Internacional das Línguas Indígenas (2022-2032), instituída pela ONU e liderada pela UNESCO, que visa chamar atenção global para a urgência de proteger esses idiomas e saberes ameaçados. O Brasil, com sua pluralidade única, tem muito a contribuir — e, mais do que isso, muito a aprender.
“Ciência e tecnologia precisam caminhar de mãos dadas com o conhecimento ancestral. É isso que permitirá que as línguas indígenas não apenas sobrevivam, mas continuem sendo o que sempre foram: uma forma de viver, de ensinar e de pertencer”, afirma Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP.
Para saber mais linguaseculturasindigenas.org.br
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